Apeles Demóstenes da Rocha Espanca

Irmão adorado da poetisa, a quem Florbela dedicou o livro Máscaras do Destino
e, em particular, o conto “O Aviador”, datado de 1927, e o soneto “In Memoriam”,
integrado no livro Charneca em Flor, publicado postumamente, em 1931.
Apeles Espanca pertencia também ao círculo cultural da época, como artista
plástico.

O Aviador Marinheiro

Apeles Demóstenes da Rocha Espanca nasceu a 10 de Março de 1897, em Vila
Viçosa.

Foi criado pela mãe biológica até aos cinco anos de idade, momento a partir do qual passou a residir em casa do pai, João Espanca, e da madrasta, Mariana, juntando-se finalmente à irmã.

Herdeiro de um singular legado artístico, por parte da figura paterna, Apeles foi um pintor modernista com elevados dotes sobre as telas, tendo criado diversos quadros a óleo e a aguarela, os quais chegaram a ser apresentados ao público e publicados na revista Ilustração, sob a direcção de João de Sousa Fonseca.

No entanto, deixou-se cativar pela vida militar e seguiu a carreira na Marinha, tendo ascendido ao posto de Tenente da Marinha e da Aviação, forçando-o a passar mais tempo fora de Portugal, muitas vezes em viagens entre Portugal e o Brasil, atravessando o Atlântico e, outras vezes, por terras africanas, como o Congo Belga, Angola e algumas ex-colónias portuguesas. De forma a atenuar a dor da distância, Apeles correspondia-se frequentemente com a família e, em especial, com a irmã.

Acabou por falecer jovem, com apenas 30 anos. Enquanto sobrevoava o rio Tejo, em Lisboa, num hidroavião Hanriot 33, realizando as provas para aPage 7/11 conclusão do brevet de piloto-aviador, despenhou-se, entre Porto Barão e Trafaria, abalando profunda e irreversivelmente a saúde psicológica e física da poetisa. O seu corpo nunca foi encontrado, mas Florbela conservou consigo dois destroços do avião, os quais a acompanharam além-vida.

Por essa sofrida razão, Florbela honrou a sua memória através do conto “O Aviador”, conto introdutório do livro de prosa Máscaras do Destino, com a seguinte dedicatória “A meu Irmão, ao meu querido Morto”.

Este Amor Fraterno

Florbela foi uma mulher singular, que viveu num tempo à frente de sua época, o que se revelou uma dolorosa incompatibilidade em termos sociais. A sociedade nunca compreendeu nem aceitou determinados comportamentos da poetisa, de que foram exemplo os seus três casamentos e o facto de levar uma vida mais
boémia e desregrada, semelhante à vida de tantos homens, mas não a vida ideal e aceitável para uma mulher. No fundo, Florbela ousou viver genuinamente a liberdade do ser e do sentir, livre das convenções sociais, orgulhosa dos seus sentimentos e pensamentos e, acima de tudo, dona do próprio destino, o que lhe valeu mágoas irreparáveis.

Entre tantas afrontas que lhe foram dirigidas, aquela que envolve o seu irmão Apeles é, sem dúvida, a mais cruel e injusta, pois deu origem ao boato de uma relação incestuosa entre ambos.

Embora a morte de Apeles tenha gerado uma insustentável cisão emocional em Florbela, significou, no fundo, a perda de uma alma gémea, com quem ela partilhava um amor fraterno extraordinário, revestido de um genuíno calor maternal, incompreensível entre os seus pares – perda que deixou na poetisa um vazio impossível de voltar a preencher.

Apeles era o elo de Florbela com a sua infância, mas foi também o seu porto seguro, assumindo o papel de estabilizador do seu equilíbrio, alguém que mais a tinha incentivado à criação poética e, por fim, aquele em quem mais se revia emocional e intelectualmente.

Através da escrita magoada, Florbela chorou durante três anos a profunda saudade gerada pela perda da sua alma-metade, do seu semi-deus, numa vida tornada ateia de amor, até cumprir finalmente o seu destino fatal, em 1930.

Um dia, chegou a confessar “eu choro o meu amor maior, o meu orgulho, metade da minha alma”, e assim atenuava momentaneamente essa intolerável saudade.

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

AA. VV., Florbela! Flor Bela! : Exposição comemorativa do Centenário de Florbela Espanca,1894/1994, org. Biblioteca Florbela Espanca, Associação Portuguesa de Artistas, Vila Viçosa,Grupo Pró-Évora, Évora, 1994 (BA. 14756 V.)
AA. VV., Florbela Espanca, Rev. Alentejana, no 332, Dezembro, Casa do Alentejo, Lisboa,1964.
BESSA-LUIS, Agustina, Florbela Espanca – A Vida e a Obra, Col. A Obra e o Homem, ed.Arcádia, Lisboa, 1979
GUEDES, Rui Guedes, Acerca de Florbela, Publicações D. Quixote, Lisboa, 1986
CASA FLORBELA ESPANCA®, Arquivo, Vila Viçosa 2020
Autoria – Franquiline Triet e Tiago Salgueiro